Pesquisa Talks é uma newsletter quinzenal feita por duas pesquisadoras de conteúdo para projetos audiovisuais.
Por Barbara Heckler e Camila Camargo
🎉 Nesta edição comemoramos 3 anos de news 🎉 Esse exercício apaixonante (e desafiador) de trazer um projeto pessoal ao mundo! Obrigada por estar com a gente nessa. Estamos animadas com as novidades que vêm pela frente!
Seixos
Bato o pé quando o algoritmo insiste em desvendar minha personalidade e erra. Agora, deu pra jorrar conteúdos que fetichizam a solidão. De irônicos a mais sérios, quase todos sugerem a reclusão como uma espécie de chave dourada do autoconhecimento. A ideia sedutora de se isolar para ficar melhor. Afinal, o inferno são os outros.
Não deixa de ser curioso que esse movimento envolve, via de regra, um grande glow up no retorno. "Suma por 3 meses e volte outra pessoa", recomendam vídeos que mostram alguém fitness, comendo pitaya, com um novo corte de cabelo. Calma, ô Taylor Swift. Não tem tanta gente aguardando sua nova era.
Até entendo o apelo dessas transformações típicas da Sessão da Tarde, mas se dar a autoimportância de um popstar parece funcionar melhor nos filmes do que na vida. Além do mais, há vantagens em poder mudar sem a pressão de um super resultado, com pessoas seguras por perto, testemunhando nossos altos e baixos.
Existe, porém, outro ponto nessa discussão que me interessa mais. Diante das infinitas distrações e demandas, tentamos nos isolar para blindar a atenção? Não tem sido simples interagir em múltiplas dimensões. Estamos em casa com os nossos, enquanto o Zoom tá no trabalho, o LinkedIn e o Instagram repercutem algo que postamos e alguém nos escreveu pra marcar algo no Whatsapp. Três emojis de coração aqui, uma resposta rápida e resolutiva sobre um projeto ali.
Nesse metaverso - mesmo sem ser exatamente como o Mark Zuckerberg anunciou que seria - construímos barreiras ao nos sentir exaustos, vazados e interrompidos demais. Mas acabamos, em nossa própria ilha, assoberbados por excesso de dopamina, scrollando, maratonando, em jogos on-line…
Momentos em que realmente ficamos bem em nossa companhia pedem muita intenção. Algumas âncoras ajudam, como tem sido pra mim a pintura de aquarela. Uma folha em branco e um pote de pinceis são o convite perfeito para eu passar umas horas quietas, dentro de mim. Essa semana, imaginei conchas coloridas misturadas com seixos, que são aquelas pedras de rio. Fui passando pro papel. Um tempo só meu e tão bom. Sem exagero, uma experiência de cura.
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CAMILA pesquisa âncoras de bem estar
Frações
Quero gritar “experimentem ficar sozinhas!”. Tentem. Finjam que morreram e se afastem por um mês.
Quem dera Tamara, quem dera.
Acompanho a saga da Tamara Klink, autora da frase acima, jovem velejadora que carrega (talvez com todo o peso) o sobrenome de seu pai, o grande desbravador solitário dos mares. “Cem dias entre o céu e o mar”, obra de Amyr Klink, foi um dos marcos de minha adolescência. O primeiro livro mais longo, mais adulto, que tinha lido até então. Toda a destemidez do navegador de ter cruzado o Atlântico Sul sozinho, a remo, foi inspirador à época.
Sua filha segue o mesmo caminho, dividindo a experiência agora de forma digital, sobre os acontecimentos que lhe acometem. Decidiu, numa façanha inédita para uma brasileira, cruzar solo o Círculo Polar Ártico em uma embarcação. Aportou na Groenlândia, onde está passando o inverno, isolada - mesmo que tenha a companhia de seus mais de 240 mil seguidores no Insta.
Seus textos são poéticos, ainda mais tocantes - ao menos para mim - quando ela narra uma carta para sua avó, que a aguarda no Brasil.
Essa frase que destaquei na abertura vem de um post que inspirou o tema desta edição. Ando, como uma mãe de uma bebê de seis meses, com uma saudade danada da minha solidão voluntária. Bateu um pouco mais rápido do que eu imaginava. Daquele tempo que eu tinha para fazer muita coisa comigo mesma, nem que fosse assistir a uma série na TV largada no sofá. Estar com a minha filha é uma delícia, mas nem por isso me tira a vontade de umas horas só pra mim. Ou uns dias (semanas? Hahah). Total de zero culpa desse sentimento, ele apenas faz parte do processo e eu o respeito e luto para ter brechas de respiro nesse maremoto.
Durante muitos anos fiz viagens sozinhas, lembranças intensas e transformadoras que guardo na memória e no meu jeito de lidar com a vida. Estar só e bem é um sinal de que há paz interior aqui.
Agora, com uma pequena a tiracolo durante uns bons anos pela frente, cada fração de solidão é bem aproveitada: seja pra ir à feira, pra ler meu livro antes de dormir, pra usufruir de uma massagem que ganhei de presente de uma amiga. Entendi que não é preciso estar na Groenlândia em volta de gelo pra ter respiros.
Delícia ter meus 27 e poucos anos, como a Tamara, e poder gritar pra se afastar das pessoas durante um mês. Já tive, já vivi, recomendo. Mas na real, na real, isso está bem longe de acontecer nos meus 39. Por hora, só frações.
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BARBARA pesquisa formas de respiro
📌 Uma Dica de Cada
[Camila] Conteúdos de 10, 20 anos atrás acabam num limbo do Youtube, por não estarem no hype do momento e nem serem velhos demais pra soar como raridade. Uma pesquisa de trabalho me levou ao programa Café Filosófico, de 2004, com o psiquiatra e psicanalista Jurandir Freire Costa. Nesta edição, ele faz uma contextualização histórica muito interessante sobre o amor romântico e fala da complexidade desse assunto, tão ligado a questões sociais, culturais e individuais.
[Barbara] Eu não vou conseguir ir, mas deixo aqui como dica imperdível se você gosta de Talking Heads. Em comemoração dos seus 40 anos de lançamento, o filme/show antológico Stop Making Sense vai passar nas telas do cinema do IMS Paulista, restaurado em 4k. Se eu fosse você, iria, quebraria o protocolo e não me manteria sentada. Dia 9/3, sábado, às 19h30 e dia 27/3, quarta-feira, às 20h.
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