Por Barbara Heckler e Camila Camargo
Farofa Fá
Queria muito participar com a minha avó de alguma prova do "Topa Tudo por Dinheiro". Era 1994, 1995… e para entender essa pira, você precisa ter crescido em uma época em que havia 5 ou 7 canais na TV, o SBT era um deles e o Silvio Santos uma unanimidade. Pessoas deslizavam em tobogãs equilibrando bandejas com taças de groselha. O menos desastrado levava 100, 200 contos.
Lá em casa, minha mãe era entusiasta da TV Cultura. Mas também rolava uma TV Colosso, uma Disney, uma Fada Bela. A infância mesclava torta na cara e conteúdo abalizado por pedagogos. Em todos os casos, eu me divertia pra valer.
Na adolescência, a MTV entrou por todos os poros, com um jeito pop & cool de apresentar novidades, sons e comportamentos. A internet era incipiente e, pra ficar só no audiovisual, havia as vídeolocadoras. Trainspotting, Clube da Luta, Kids, o sabor de descobrir aquilo que não passava na Sessão da Tarde, mas que eu gostava e ficava interessada igual.
Com esse repertório, cheguei à faculdade de comunicação, um ambiente que cria novos filtros, novas perguntas e olhares pro Silvio jogando aviãozinho de dinheiro pra plateia. Tive contato com o cinema nacional para além de Trapalhões e Ilha das Flores. Descobri algo de cinema europeu. Amélie Poulain era tipo Uau! Vez ou outra a NET deixava aberto o sinal do Telecine. E tinha as Mostras de Cinema com meus novos amigos! Agnès Varda, Sofia Coppola, Laís Bodanzky. No meio disso, pencas de reality show, que eram uma inovação. O começo dos anos 2000 foi uma grande farofa, com ingredientes que iam de banana a damasco.
Trago um pouco dessa bagagem pra dizer que correram duas boas décadas e hoje trabalho do outro lado do balcão. Criar e pesquisar conteúdo para séries, filmes, ficção ou documentário, é pensar sobre entretenimento num momento em que elaboramos novas e necessárias representações, autorias e protagonismos.
Esse conteúdo é preconceituoso? É inclusivo? Fere alguém? Minha cabeça vive cheia de asteriscos (arrisco que a sua também), mas tenho buscado sair daquele piloto automático que resulta em projetos "corretos”, mas burocráticos e, em última análise, chatos.
A solução não é tão simples e nem deve ser. Mexe no fundo da caldeira, passa pela revisão dos modelos de investimento e de equipe, do eixo das produções, pela reimaginação da estética, da linguagem, dos pontos de vista, pelo recuo dos privilégios. Mas quero fazer desse processo algo provocador, suculento, instigante. Tem iniciativas brilhando nesse sentido e eu não tiro o olho delas.
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👀 Falando nisso, terminei agora de assistir "The Bear", no Star+, e descobri aliviada que a série é menos indie do que eu imaginava. É moderna, esperta, drama e comédia, e grazadeus tem um final de temporada bonito e piegas.
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CAMILA pesquisa e é fã de farofa
Um tanto irônico
Confissão: me tornei uma pessoa esnobe da bolha Zona Oeste de São Paulo no quesito TV.
Não foi sempre assim não. Acompanhava uma novela facilmente até os 30 anos. Daquelas com diálogos robóticos da Sandy em “Estrela Guia” (hahaha, juro que assisti a isso), até a atuação maravilhosa de Alexandre Nero em “Império” e suas discussões com a musa Lilia Cabral, a Maria Marta. Que obra, senhoras e senhores. “Avenida Brasil” e a Carminha (“oi oi oi”), sucesso absoluto, não me pegou (POLÊÊÊMICO). Apesar de Carminha ainda garantir os melhores memes junto a Nazaré Tedesco, diva vilã de todos os tempos (Vale a pena ver de novo).
Antes dos streamings e de ter uma TV a cabo, era isso que me esvaziava a cabeça no fim do dia. Com o tempo, esqueci sobre a importância da novela nacional para a formação e profissionalização do audiovisual no país, com uma grande audiência. É um produto de exportação altamente reconhecido. E ponto.
Embora eu, cá na redoma, tenha deixado esse gosto de lado, percebo, olha só, que nem tanto assim. No fundo, sempre encontro uma novelinha geralmente na Netflix pra desopilar. “Bridgerton”: quer mais mamão com açúcar do que esse drama romântico da realeza londrina com djovenss? Poderia ter sido filmado no Projac certamente. “Call my agent”, ou “Dix pour cent”: categorizaria como uma produção das 21h na Globo, das melhores. A divertida série sobre agentes de atores e atrizes e suas vidas disgramentas para lidar com egos inflados.
Pois é, o que eu fiz então foi mudar de língua e plataforma, não de intenção. Plano 2023: voltar meu olhar ao que há de melhor do popular televisivo brasuca. Me conta qual novelinha você acompanhou com fervor? Você tem uma aí certeza.
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BARBARA diz que não, mas pesquisa novelinha ainda pra assistir
Você me interessa:
Maria Clara Villas trabalha com produção de conteúdo e pesquisa. Autora da newsletter quinzenal
, tem um olhar afiado para achados da internet.***
Qual seria o melhor resumo do que você faz aqui, no mundo?
Sou aquela pessoa que adora indicar uma série, dar dica de um restaurante novo, mandar um link com uma reportagem que achei a cara da pessoa, pesquisar tudo sobre um lugar antes de viajar. Sempre tive uma curiosidade muito grande dentro de mim e fico feliz quando olho pra trás e percebo que todo o meu caminho até aqui teve muito a ver com essa mistura de referências e interesses. Atualmente trabalho com produção de conteúdo e pesquisa, além de dividir um pouco das minhas descobertas virtuais em uma newsletter quinzenal, a
. A felicidade da minha vida é poder pagar os boletos produzindo conteúdo, fazendo vídeo, pesquisando tendências e trabalhando na área da cultura, só coisas que eu amo! E fora do trabalho estou sempre planejando a próxima viagem, assistindo a reality shows ruins com a minha mulher e fazendo muito chamego nos meus dois vira-latas caramelos.Se fosse fazer uma salada com os ícones favoritos de cultura pop da sua infância e de hoje, o que ou quem entraria nessa receita?
Sempre fui fascinada pela ~internet, dei meus primeiros cliques no chat do ICQ, virava a noite para conseguir criar perfis no Fotolog, era ativa nas comunidades do Orkut e baixava templates pro meu blog. O meu jeitinho geminiano cheio de curiosidade pelo mundo me fazia revirar fóruns atrás de links de séries em RMVB legendado, a baixar bootlegs de bandas desconhecidas e ficar feliz em encontrar outras pessoas com interesses tão específicos como o meu. Acho que a minha salada de ícones de cultura pop tem um tempero especial de internet discada e referências que vão de Miyazaki a Kardashians, passando por Beyoncé, documentários sobre cultos e seitas, memes, RuPaul’s Drag Race, livros sobre futuros distópicos e funk carioca.
📌 Uma Dica de Cada
[Camila] The Bear, do Star+. Chegando por último no hype, mas será que sou a única? Já tem uma 2a. temporada no forno.
[Barbara] Only Murders in the Building (Star+). Protagonizado por Steven Martin, Selena Gomez e Martin Short, a narrativa gira em torno do prédio em que moram, em NY, e os misteriosos assassinatos que passam a acontecer. Na onda do podcast de true crime, o trio resolve criar um programa e se torna investigador dos casos.
[Maria] Escutei no final do ano passado o podcast Death of an Artist que está fritando a minha cabeça desde então: a série conta a história da morte trágica da artista cubana-americana Ana Mendieta, que era casada com o escultor Carl Andre, conhecido por sua personalidade violenta, especialmente com mulheres. Carl foi acusado de matar Ana em 1985, que foi jogada da janela do apartamento deles. Apesar de um julgamento cheio de influências, racismo, machismo e advogados caros, ele foi inocentado, mas tudo aponta que ele foi sim o assassino. Não sou a maior fã de true crime de todos os tempos, mas a série é narrada pela ex-curadora-chefe do Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles e é um grande exposed do mundo da arte, além de se aprofundar na vida e obra dessa artista incrível que todo mundo deveria conhecer. Vale a pena!
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Que edição deliciosa de ler! Minha alegria de infância era poder assistir o Em Nome do Amor, me sentia uma mini-adulta (tadinha, nem sabia que era péssimoooo ser adult) e atualmente a minha novela do coração é O Rei do Gado, que nunca tinha visto e estou acompanhando no Vale a Pena Ver de Novo, depois de anos sem assistir a novela nenhuma também. Adorei saber que a Maria Clara tem dois caramelos e também gosta de ver coisas sobre seitas (não me senti mais tão estranha sozinha, haha).
Barbara, por favor veja pantanal!